Ghost In the Shell - Anime vs Filme
- Silézio Luiz
- 30 de out. de 2017
- 6 min de leitura

Assim, esse texto será longo e tendenciosamente chato. Sério, vou falar bastante, então se você estiver de "good mood", prossiga.
Good mood, e good vibes que talvez sejam o que originou esse texto.
Muito se esperou a adaptação daquela que por muitos é considerada a maior obra dos animes ou a maior obra de ficção científica de todos os tempos, uma das maiores influências do revolucionário e já velhinho Matrix.
Ghost in the Shell, a animação é considerada inclusive superior a obra que lhe deu origem, o mangá. Então era natural que ao ser anunciada a adaptação live action para cinema, alguns ovos fossem quebrados. A começar pelo white wash (trocar a etnia de personagens pela caucasiana) do elenco, afinal sob a desculpa de não haver suficientes atores orientais com domínio de inglês mais uma vez foi mascarado o preconceito do povo ocidental na 7ª arte (Eu tive esperança até o último momento que fossem chamar a Rinku Kikushi, de Círculo de Fogo para viver a Major Kusanagi). Mas depois de assistir ao longa estrelado pela sempre "adjetivável" Scarlett Johanson, percebi que esse não é o crime cometido pelo filme. Pior, o filme em si pode não ter cometido crime algum. O culpado no fim das contas, a meu ver, é o público. Discorro abaixo a razão desse pensamento.
Indústria
O cinema, é uma industria. A produção de um filme tem custos, muitos e pesados. Salários tem que ser pagos e é claro, ninguém trabalha de graça e também ninguém quer trabalhar só para suprir seus custos. Você não trabalha para pagar conta de luz, água, internet e comida somente, você anseia que sobre pelo menos um pouco, para investir, seja em si mesmo ou financeiramente (que é investimento em si mesmo, mas enfim). Então, claro que os produtores do filme querem vender bastante. Para que os produtores, que são aqueles capazes de tirar a obra do nicho dos animes, do nicho específico dos animes scifi, do nicho mais específico ainda que é Ghost in the Shell, é preciso audiência.
Ou seja, para o filme ser viável, ele tem que ser comercial, em suma, deve ser passível de apreciação pelo maior número de pessoas possível, para que nesse maior número de pessoas possível haja gente suficiente que não pirateie ou baixe e vá ao cinema e pague o ingresso. Então, vamos pular o óbvio que é o preço de um ingresso no nosso país, esse país gostoso e bem, ordinário, e vamos ao segundo ponto.
O público
Não consigo deixar de refletir o quanto o volume de informação da era da informação seguido do excesso de informações erradas da era da desinformação contribuem para uma maior fragilidade do ser humano como um todo. Sim, essa será a parte longa do texto. As pessoas estão cada vez mais chateadas e desapontadas, seja com as pessoas próximas pois as redes sociais mostram o quanto um indivíduo pode ser diferente daquilo que conhecemos. Estão decepcionadas com aqueles em quem depositam suas esperanças, sejam políticos, ídolos, etc. Com tanta informação, verdadeira ou falsa sobre tudo as pessoas se blindam, porque afinal de contas, quem quer se decepcionar, se envolver, se sentir triste e frustrado?
Mas, a vida não é feita de querer, a animação Divertidamente nos ensina muito bem. Não podemos nos privar de sentir aquilo que não gostamos. Não podemos nos privar de sentir raiva, medo e tristeza, pois esses sentimentos combinados com os que gostamos, numa mistura específica dão significado ao que somos. Se nos privamos de nossos próprios sentimentos, naturais e comuns a todo mundo, passamos a não ser nós mesmos e começamos a buscar algo que agrade a alguém que queremos ser. Alguém sempre feliz, bem disposto, esteticamente aceito. Ignoramos o quanto é importante as vezes sentir tristeza e aprender com isso, aceitar nossas pequenas imperfeições e de perceber que as vezes a indisposição é só um pedido de socorro do nosso corpo, ninguém é de aço. Esse alguém que nós idealizamos acaba por querer as coisas simples e bonitas. Filtramos só o que nos faz felizes e convenhamos que reflexão demais as vezes vai nos botar pra baixo, pensar no que somos, pra onde vamos e toda nossa essência, buscar auto conhecimento, é muito trabalhoso, cansa.
Queremos estar sempre festejando, sempre rindo. Então escolhemos as coisas mais fáceis pois o difícil pode ser frustrante, o que é mais bonito por fora, pois não temos tempo de ver o que há por dentro, piadas rasas e fáceis em contextos que já sabemos desde a adolescência. E o que isso tudo tem a ver com o filme de Ghost In the Shell?
Uma obra densa
O anime Ghost in the Shell não é para ser assistido quando se quer Velozes e Furiosos ou American Pie. O mínimo que ele vai lhe causar de reação, é cabeça quente. Você vai pensar, durante e após assistir a obra. Tem, é claro elementos de ação, mas é mais pautado na filosofia, na dualidade niilismo e existencialismo. É uma obra para ser assistida diversas vezes, e a cada experimentação irá gerar pensamentos e sentimentos diversos. Novos detalhes e entendimentos sobre a história e seus personagens são recorrentes. E se você se veste da máscara da facilidade e felicidade constantes, com medo de se frustrar, com medo do desconhecido (os sentimentos que você reprime) a quantidade de variáveis expostas na obra, só vão lhe levar pra um lugar que você não conhece e não gosta, e talvez que você não tenha maturidade suficiente para encarar porque não conheceu ainda. E, se você for ao cinema pra não sair de lá tirando foto rindo no instagram, você não vai. Então o público levou o estúdio e produtores a um caminho.
Adaptação
Aqui meus amigos, mora o equilíbrio da coisa toda. É onde os responsáveis pelo filme decidem o que é possível de transpor para a telona e que vá levar pessoas ao cinema. A linha tênue de transpor uma obra de uma mídia para outra, sem perder sua essência ou pelo menos a maior parte dela. Nisso, temos o rosto conhecido e querido pelo público de Scarlett Johanson, o que no fim das contas não deixou de ser uma boa escolha pois não só é um nome muito comercial como uma atriz muito competente, capaz de dar vasão à personalidade única da Major. A ambientação, linda no anime é igualmente rica aqui e o ponto que não só foi respeitado, mas enriquecido no live action. É um filme visualmente deslumbrante e intimamente ligado com o cerne da trama de Ghost in the Shell. Restou adaptar a trama, e aí, em um dos pontos centrais da obra foi feita a maior adaptação. Não pode ser dito que se a obra não carregasse o nome Ghost in the Shell, a trama seria simplória, longe disso, mas para quem assistiu o anime e seus derivados ela ainda está longe da complexidade e beleza da original, todavia para o grande público embora ainda apreciável, ela carece de apelo que obras mais simples teriam pra ele.
Enquanto eu assistia o filme, eu via a essência de Ghost in the Shell, aqui e ali, as vezes com mais ou menos frequência, mas no final, depois de tudo na minha mente estava apenas o visual e as cenas fielmente adaptadas das sequências de ação, e por fim percebi que não tinha visto Ghost in the Shell.
Então é pra quem?
Assim, parece que o filme se perdeu no momento em que devia ter sido decidido seu público. Pois se ele não é para o grande público que irá consumir enredos simples e ação, tampouco se preza aos fãs que no máximo verão uma sequência de homenagens mas não a obra em si adaptada finalmente.
Então fica aqui a minha dica para você, e não para a industria, pois ela não vai me escutar, não vai escutar qualquer outro crítico ou o que o valha.
Mas para você, que se esconde dos seus sentimentos, é natural sentir medo, mas você só se desenvolve, só entende o que é o espírito dentro da sua casca, seu Ghost in the Shell, se você viver o que sentir, se você fabricar sentimentos, situações e felicidades artificiais você vai se tornar um humano artificial, como o do filme, que para poder beber mais, trocou seu fígado por um artificial, aprimorado, mas até que ponto você pode se trocar sem perder a humanidade dentro de você?

Ô filme lindo!

Ô mulher linda!
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