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Samurai X - Mas é uma cruz uai

  • Foto do escritor: Silézio Luiz
    Silézio Luiz
  • 4 de dez. de 2017
  • 5 min de leitura

Kenshin Himura, o retalhador. Retalhador é uma palavra bem forte né, e ainda tive que crescer ouvindo que anime é coisa de criança. Rorouni Kenshin é o nome original em japonês de um dos animes de maior sucesso a chegar aqui no Brasil lá no século passado na onda dos Cavaleiros do Zodíaco.

Minha memória mais antiga do desenho em muito é afetada pelo fato de ter sido exibido na purista Rede Globo.

Vocês sabem né, animes por si só já tem bastante material censurável imagina um com um samurai que é chamado de retalhador.

Com isso vim a reassistir a obra já depois dos vinte e poucos anos (fique a vontade para imaginar a música 20 e poucos anos enquanto lê isso). Só então pude apreciar o desenho como deveria, com todas as cenas. O problema da minha experiência com a saga de Kenshin Himura tem origem na própria dificuldade de ver a obra, gostei muito da dublagem brasileira, e achei a voz dele em português muito competente em fazer a versão ocidental da voz suave do espadachim, mas a versão dublada, mesmo a mais recente é cheia de cortes e adaptações, especialmente na segunda saga logo após a história do vilão Shishio (Saga da Jupon Gatana), volto nessa segunda parte daqui a pouco.

Em japonês, quem dubla o ex-samurai e assassino da era Tokugawa e andarilho na era Meiji, é uma mulher. Isso pois o protagonista passa a imagem de ser fraco, pois é franzino, o que faz com que a primeira vista, não seja digno de respeito, até pelo menos reconhecerem quem ele é por sua cicatriz em forma de cruz na face, sim, é uma cruz, não é um x. Samurai x é mais uma pérola da adaptação brasileira.

Mas já que falei de respeito, vamos fazer um rápido corte, e falar sobre uma coisa que percebi pela primeira vez assistindo Rorouni Kenshin e filmes de Samurai. Temos essa idéia linda do japonês como povo respeitador, que respeita os mais velhos, e realmente respeita, mas imaginamos que seja o respeito romântico por compaixão ou humanismo.

Admiramos a forma como os Samurais respeitam seus senhores não é mesmo. É tudo muito ordeiro, muito bonito. Mas o respeito real, do guerreiro, do samurai, é o respeito pela força. Se observarmos bem, a figura do guerreiro japonês sempre está buscando vencer alguém mais forte, se tornar mais forte. Não acontece em uma, duas ou três obras, sejam quais for, escritas, animadas, cinemáticas de determinado personagem mudar sua concepção sobre seu oponente após o testar em combate. Isso, na realidade é um dos motivos de lutarem tanto, como os duelos entre samurais. Testar o valor, o quanto se deve respeitar o outro.

Uma outra faceta do respeito no oriente que também notamos, é o respeito a propriedade. Pouco notamos o respeito a mulheres na cultura oriental, tanto que até hoje há a figura preferida dos "hentais" (pervertidos) japoneses por mulheres indefesas. Crianças também são mostradas apanhando (Cavaleiros do Zodíaco por exemplo) quando são fracas, pura e simplesmente por esse motivo. Mas o respeito à propriedade é mantido, pois normalmente, seu proprietário é poderoso. Esposas de samurais eram respeitadas, esposas de camponeses, estupradas. Triste notar isso, mas o respeito ao idoso japonês pode muito bem advir da força que esse detém pela experiência e não o respeito puro que imaginamos. Não raro vemos obras onde personagens adolescentes que se deixam levar pela sua força desrespeitam idosos, dentre outros.

Mas qual a relação disso com Kenshin Himura, ex assassino do imperador Tokugawa, mais temido entre os samurais de sua época, que decidiu parar de matar e usa uma katana com fio ao contrário, deixou de ser samurai e virou andarilho? Tudo!

Kenshin não é de forma alguma um indivíduo respeitável a primeira vista para os japoneses de sua época. Após lutar pelo fim do regime que defendeu e ser um dos responsáveis pela "paz" da nova era, a era meiji toda a pompa do assassino mais temido do japão se desfaz como pó. Magro, sempre olhando pra baixo e com uma voz quase feminina. No japão a dubladora faz um timbre um pouco menos grave, mas se nota que é uma mulher.

Kenshin é um símbolo pra diversas minorias, é símbolo de um passado muito romantizado e pouco refletido fora do Japão. Sabemos bem que é um país tradicionalista e que muitos aspectos de sua cultura levaram gerações para evoluir ou se alterar. Um personagem que aparentemente é fraco, e carrega em si estigmas de fraqueza de mulheres, dos pobres e desamparados, mas que é capaz de mudar e história de seu país. Esse personagem fala muito sobre como o japonês teve que aprender a se conhecer e se reinventar para se tornar o povo sobrevivente e batalhador que conhecemos na atualidade.

Mais do que ação e lutas, o mangá e a animação falam do conflito entre ideais de seus personagens. Nem o tido herói, tampouco o dito vilão lutam por si próprios, lutam por algo maior que eles, algo em que acreditam, e que pasmem, não é por alguém, não é por Atena, não é pela paz, não é pelo brioche da padoca. O vilão do primeio arco, Makoto Shishio, é um ex retalhador do governo, assim como Kenshin. Durante todo o desenvolvimento da trama temos a impressão que ele é um vilão sádico, mas a medida que o conhecemos percebemos que é apenas mais uma pessoa, lutando pelo que acredita, só que em vez de lutar por um sonho, um emprego, uma faculdade, um indivíduo com tamanha habilidade e influência luta pelo que ele acredita ser o destino correto de uma nação que ele agora vê, graças a tudo que aprendeu, como fraca e corrupta. Há, em diversos momentos justiça nas falas de Shishio. Antes da modinha dos personagens com tons de cinza, a obra já apresentava uma variedade de personagens com as mais diversas motivações para tudo. E não há como negar o carisma de todos, tão reais e tão diversificados. Mesmo os personagens "preto no branco" maus ou bons tem uma profundidade muito grande.

É interessante notar que os dois antagonistas possuem, cada um uma musa, e musa pessoas não é só mulher bonita, musa é alguém que te inspira, pode ser de qualquer sexo e nem precisa ser pessoa. No caso Shishio e Kenshin são apoiados por duas mulheres devotadas aos seus ideais e aos ideais de seus amados. Por mais sábio e forte que o retalhador se mostre, é Kaoru quem o puxa de volta cada vez que ele é tentado a matar novamente. Ele inverteu o fio de sua espada para ao invés de ferir os outros, se ferir, num ato de contenção, se matar à matar outras pessoas novamente. Mas a cada adversário sedento por provar a força de kenshin, observamos que o fio da espada pouco importa, mais vale a determinação deste.

O povo japonês, devastado pelas tantas guerras e tragédias naturais, enxerga em personagens como Kenshin, a capacidade de se reerguer, de se superar. De reconstruir cidades após desastres, após a segunda guerra, entendem que a força de verdade não reside no fio da espada mas na ombridade, respeito e dedicação de seus trabalhadores, de seus outrora camponeses e fracos sem valor.

Rorouni Kenshin só não é minha obra oriental favorita da vida pois existe Sete Samurais de Akira Kurosawa e como dito anteriormente minha experiência de consumo teve muitos percalços. Especialmente a segunda saga, do samurai cristão, que até hoje não terminei. É uma saga que talvez até hoje seja muito controversa, pois retrata o período onde jesuítas foram ao japão bem como a abertura do Japão para o mundo, que já havia sido explorada um pouco durante a temporada anterior. Há referências a diversos personagens e símbolos cristãos, o que dificultou a adaptação para exibição no Brasil. E ainda pesa o fato de que nessa fase há uma tentativa de elevar os combates e o desenho começa a meio que se equivaler aos tradicionais com personagens super poderosos e lutas espalhafatosas.

Conclusão

Mais do que um entretenimento, Rorouni Kenshin (não chamarei de Samurai X, ele sequer é samurai mais) é uma obra para se mentalizar, refletir e aprender.

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